ANÁLISE
DA VIOLÊNCIA EM ESCOLAS PÚBLICAS E PRIVADAS DE BAIRROS DE CLASSE SOCIAL A, B, C
DO MUNICÍPIO DE SÃO LEOPOLDO – RS
RESUMO
Diante de uma
sociedade juvenalizada em que os valores e atitudes éticas vêm se perdendo a
cada dia, a escola tem o papel de instruir, orientar e formar crianças e jovens
a viver e trabalhar em um mundo diversificado e em constante mudança. No
entanto, tal função vem sendo ofuscada pelos diversos tipos de violência
ocorrentes nesses locais. Frente a essa problemática, estudos relacionados ao
tema são importantes para promover a sensibilização por parte da comunidade
escolar, famílias e entidades relacionadas à segurança e educação. É com esse
intuito que o presente trabalho busca analisar, através de dados estatísticos,
a relação existente entre violência e classe social em determinadas escolas da
rede de ensino pertencentes ao município de São Leopoldo/RS, como também a
incidência de alunos vítimas do bullying
e a percepção da comunidade frente à segurança pública. Os dados foram
coletados a partir de um questionário pré-elaborado aplicado em turmas de
terceiro ano do ensino médio pertencentes a seis escolas da rede municipal,
entre elas quatro públicas e duas privadas. Foram escolhidas duas instituições
por bairro, nas diferentes classes sociais (A, B e C). A análise indicou que a
violência e o preconceito sofrido por alunos (bullying) estão presentes em todas as escolas da rede de ensino
público e privado no município independente da classe social a qual estão incluídas.
Palavras-chave:
Violência nas escolas. Bullying. Classes
sociais.
ABSTRACT
Front of a young society in which values and
ethical attitudes are being lost every day, the school's role is to educate,
guide and instruct children and young people to live and work in a diverse
world and constantly changing. However, this role has been overshadowed by the
various types of violence occurring at these sites. Against this problem,
studies related to the subject are important to promote awareness the school community, families and organizations
related to safety and education. Within this intention that paper seeks to
examine, through statistical data, the relationship among violence and social
class in some schools in the district of Sao Leopoldo / RS, as well as the
incidence of victims of bullying and the
perception of the community against public safety. Data were collected from a pre prepared
questionnaire applied to groups of third year high school by six municipal
schools, including four public and two private. Two institutions were chosen by
district, in different social classes (A, B and C). The analysis indicated that
violence and preconception suffered by students (bullying) are present in all
schools in the network of public and private schools in the county regardless
of social class which are included.
Key-words: Violence in schools. Bullying. Social
classes
1
INTRODUÇÃO
Violência
e criminalidade são palavras que estão cada vez mais presentes no cotidiano das
pessoas acarretando medo e insegurança. A Organização Mundial da Saúde (OMS)
conceitua a violência como:
Uso
intencional da força física ou do poder real ou em ameaça, contra outra pessoa
ou contra si próprio ou contra outro grupo de pessoas que resulte ou tenha
grande possibilidade de resultar lesão, morte, dano psicológico, deficiência de
desenvolvimento ou privação. (OMS, 2010)
A
violência é um fenômeno complexo que não possui uma causa única, mas sim razões
variadas que contribuem para sua ocorrência. Segundo Chesnais (1997), seis
fatores contribuem para o aumento da violência no Brasil:
·
fatores sócio-econômicos, oriundos da
desigualdade e vulnerabilidade social;
·
fatores institucionais, relacionados à
insuficiência do estado, crise dos modelos familiares e recuo do poder da
igreja;
·
fatores culturais, como problemas de
origem histórica, conflitos étnico-raciais e de desordem moral;
·
demografia urbana, devido ao crescimento
das taxas de natalidade e expansão urbana desordenada causando grandes
aglomerados urbanos;
·
poder da mídia, que ao enfatizar
notícias sobre violência, acaba influenciando a percepção do cidadão; e, por
fim,
·
a globalização mundial, através da disseminação
do crime organizado.
Infelizmente,
a violência cada vez mais faz parte do nosso dia-a-dia, o que pode ser
constatado em todos os meios de comunicação.
Rodrigues afirma que:
A
violência é contemporânea do homem. Filósofos, cientistas políticos, sociólogos
e psicólogos tem se dedicado ao estudo do comportamento agressivo e violento
entre os homens, mas resultados desanimadores têm sido obtidos no concerne à
prescrição de meios capazes de evitar, ou ao menos diminuir, a agressividade
humana. (Rodrigues, 1978, p. 363)
Estudos afirmam que a violência pode ser caracterizada de
acordo com diferentes variáveis, relacionadas:
·
às vítimas (crianças, mulheres, idosos, etc.);
·
aos agentes (gangues, jovens, policiais, etc.);
·
à natureza da ação (física ou psicológica);
·
à motivação (política, social, econômica, racial, etc.);
·
ao local de ocorrência (urbano ou rural); e
·
à relação entre a vítima e o agente (violência familiar,
entre conhecidos ou desconhecidos).
Os
impactos da violência trazem danos sociais e políticos que podem ser mensurados
a partir da transmissão de violência entre gerações, redução da qualidade de
vida e comprometimento do processo demográfico. Não há soluções estabelecidas
para prevenção e controle da violência, mas existem diversas propostas. Entre
as propostas de prevenção, pode-se relacionar a questão da redução da pobreza e
da melhoria na área da educação. Já como medidas de controle, muitos defendem
uma maior quantidade e disponibilidade de recursos policiais e mais vagas no
sistema prisional.
Considerada como fenômeno multidisciplinar, a violência
necessita de diferentes forças governamentais e sociais para promover fatores
de prevenção e controle. Conforme Rosa,
segurança é um bem fundamental para as pessoas, para o país e uma das
principais obrigações do Estado para com o cidadão, uma vez que ter segurança
significa viver sem estar sob risco de sofrer uma violação de sua propriedade,
de sua integridade física, de sua liberdade ou de sua vida. O convívio em
sociedade só é possível quando cada indivíduo tenha um mínimo de segurança que
lhe permita trabalhar, estudar, consumir, aprimorar-se e divertir-se, em casa
ou na rua, sem que esteja sob risco de ser agredido ou lesado. (Rosa, 2009, p.
08)
Fatores diversos como a
precariedade dos serviços públicos e de qualidade de vida, unidos à falta de
oportunidades, emprego e lazer, além das escassas perspectivas de mobilidade
social, entre outros, são motivadores de ações violentas. Tal conjuntura motivou a realização deste
trabalho, o qual buscou estudar os mecanismos de violência no âmbito escolar,
uma vez que, como colocado anteriormente, este tema está ligado à educação e
perpassa pelos bancos escolares. Destarte,
como educadores, também é de nossa responsabilidade desestimular práticas que
possam incitar a violência.
Assim sendo, este trabalho procurou analisar uma
possível relação entre violência e classes sociais em escolas da rede de ensino
do município de São Leopoldo,RS. Além
disto, procurou-se verificar a incidência de alunos vítimas de bullying, bem como a percepção da
comunidade frente à segurança pública em geral.
1.1
CONTEXTUALIZAÇÃO DO TEMA
Nos
últimos anos o Brasil passou a ser associado ao fenômeno do crime e da
violência, tanto interna quanto externamente. Tal fato é constatado através da mídia que
veicula matérias mostrando rebeliões, conflitos diversos envolvendo meliantes,
policiais, movimentos sociais etc. O Estado
do Rio Grande do Sul, o mais meridional do país, também apresenta altos índices
de violência, especialmente nas proximidades de sua capital, a região
metropolitana de Porto Alegre (RMPA).
O
município de São Leopoldo, foco deste trabalho, pertence à RMPA, dista pouco
mais de trinta quilômetros da capital e vem sendo retratado pela mídia como um
dos mais violentos do Estado. O
incremento populacional do município nas últimas
décadas, um possível gerador de violência, resulta, principalmente, de
migrações alavancadas por baixos preços da terra, pelas facilidades de emprego
nas áreas de expansão econômica, pela interligação das malhas urbanas e por
processos emancipatórios em períodos relativamente recentes (BRUNET et al,
2007). Nos últimos anos, o município tem
experimentado um expressivo crescimento da pobreza e do desemprego, além de um expressivo
aumento dos índices gerais de violência (HENNINGTON, 2008).
Fundada
em 1824, São Leopoldo é o berço da colonização alemã no Brasil. Os primeiros imigrantes chegaram a Porto
Alegre, capital da província de São Pedro do Rio Grande, em 18 de julho de
1824. Logo depois, foram enviados para a
desativada Feitoria do Linho Cânhamo, um estabelecimento agrícola do governo,
que não dera resultados. Essa feitoria
localizava-se à margem esquerda do Rio dos Sinos que banha a região. [1]
São
Leopoldo conta atualmente, segundo IBGE, com uma população estimada de 214.087
habitantes, distribuídos em uma área de 102,739 km2. Possui uma área urbana de 69,87 km2 (68,29%)
contra uma área rural de 14,84 km2 (14,50%), além de uma área de
preservação de 17,60 km2 (17,21%). (IBGE 2010) O município é
composto de 24 bairros, possuindo distintas características de desenvolvimento seguindo
uma urbanização segmentada conforme apontam o Plano Diretor Municipal, o
Zoneamento Específico para as zonas, bem como a Planta de Valores Venais para
cobrança de IPTU. PMSL( conforme Secretaria
Municipal de Planejamento e Coordenação (Seplan).
Este
regramento fez com que os bairros começassem a ter características
próprias. A divisão provocada pelo Rio
dos Sinos (zona sul e zona norte) colaborou para a análise realizada em função
de uma classificação por camada social (alta, média, baixa e de interesse
social). O núcleo central possui o metro
quadrado mais caro do município na planta de valor venal, possuindo uma
característica comercial mais acentuada.. Os bairros do entorno (Morro do
Espelho, Padre Réus, Cristo Rei) são bairros com características residenciais de
classe alta. Os bairros Jardim América,
Santa Tereza, Duque de Caxias, Fazenda São Borja, Rio Branco, Pinheiro,
Campestre, formados a partir dos corredores de desenvolvimento, ou seja, das
principais avenidas comerciais, constituem-se como bairros mistos de classe
média, com residências, indústrias e comércios. Já o bairro Feitoria, também caracterizado como
zoneamento misto, possui áreas de interesse social destinadas às classes sociais
mais baixas.
Outra
particularidade observada é a divisão do município pelas rodovias BR 116 e RS
240. Na zona oeste, separados pela BR
116, situam-se os bairros São João Batista, Vicentina e São Miguel. O primeiro caracteriza-se por ser constituído
por uma zona mista onde vivem famílias de classe predominante média/baixa, comportando
indústrias de grande e médio porte, residências e pequenos comércios. Os demais bairros possuem uma característica
mais residencial, contemplando, também, áreas especiais de interesse social
passíveis de regularização fundiária.
Na
zona norte, o regramento se dá a partir do bairro Scharlau. A partir desse bairro, suas adjacências
evoluíram de acordo com sua localização. O bairro Arroio da Manteiga possui
características residenciais, comerciais, industriais, contendo também áreas
especiais de interesse social. O bairro
Campina possui a mesma característica, assim como os bairros Rio dos Sinos e
Santos Dumont, todos com históricos de enchentes e alagamentos por estarem
situados abaixo da cota de inundação. Na
zona noroeste, encontra-se o bairro Boa Vista que possui loteamentos a partir
da RS 240, com características industriais e comerciais até uma zona
residencial mais seletiva junto à divisa com o município de Novo Hamburgo. Esta região igualmente apresenta uma zona de
áreas especiais de interesse social ligada ao bairro Boa Saúde, hoje
pertencente ao município vizinho, com grandes vazios urbanos a serem ocupados.
1.2
AS ESCOLAS E O MUNICÍPIO
São
Leopoldo pertence à 2ª Coordenadoria Regional de Educação. Conforme a Secretaria de Educação do Rio
Grande do Sul – SEC (2010), atualmente existem 132 escolas no município, sendo
43 particulares, 27 estaduais, 62 municipais e uma universidade. Ainda, de acordo com a Secretaria, em 2008,
foram realizadas 7.423 matrículas na rede escolar de ensino médio, sendo 6.423
na rede pública estadual e 1.000 em escolas particulares. O corpo docente deste nível de ensino é
composto por um total de 499 professores, sendo 358 docentes vinculados a
escolas públicas estaduais e 141 a escolas privadas.
1.3 A REALIDADE DA
ESCOLA NA SOCIEDADE ATUAL
Vivemos em uma sociedade onde valores e atitudes éticas vêm
perdendo espaço a cada dia. Neste
contexto, a escola tende a assumir determinados papéis outrora dedicados à
família. Cunha (2010) dispõe que
Se antes a função da escola era instruir e a função
da família era educar, hoje essa ‘divisão do trabalho’ educativo vai ganhando
novos contornos. Talvez o maior desafio presente nesta relação diga respeito à
proporção que a escola adquire em nossa sociedade. (CUNHA, 2010, p. 640)
Mais adiante, a autora
salienta, ainda, para o fato de que a partir da idade moderna há uma nova
identificação das famílias para com a escola, onde esta ganha
uma
centralidade e o reconhecimento de que é, por excelência, um espaço de
sociabilidade que ultrapassa as fronteiras de classe social e que não é apenas
um espaço de aprendizagem cognitiva, dos conteúdos curriculares. A criança
aprende na escola também regras, normas e valores que serão importantes para o
seu futuro papel de adulto. Todos, de alguma forma, tem algo a esperar da
escola. (CUNHA, 2010, p. 640)
A escola tem, portanto, uma função primordial: a de instruir,
orientar e formar crianças e jovens a viver e trabalhar em um mundo
diversificado e em constante mudança. No
entanto, tal papel vem sendo ofuscado pelos diversos tipos de violência
ocorrentes nesses ambientes.
Rebés (2000) aponta ao fato de que a escola é
reconhecida como espaço propício à violência. Os atos de violência atingem tanto escolas
públicas quanto particulares, acarretando consequências à sociedade, tornando
todos os indivíduos inseguros diante da violência. Conforme o autor, os
atos de vandalismo, o uso de drogas, as
brigas entre colegas, as trocas de tiros, os espancamentos, as ameaças e, até
mesmo, mortes prejudicam o presente e o futuro da escola, evidenciando um
desejo de destruição. Ir à escola, atualmente, resulta em medo e
intranqüilidade (sic). O próprio Estado há muito tempo, não tem garantido
acesso à escola pública para todos, o que desencadeia novas modalidades de
exclusão social pelos mecanismos de seleção que o sistema educativo oferece. Como
conseqüência (sic), a escola se torna um dos alvos das várias manifestações de
violência, interna e externa. Esse conjunto de situações oportunizou a
realização de estudos, pesquisas e reflexões, com o objetivo e o desejo de
encontrar o equilíbrio na vida da sociedade e da instituição escolar. (REBÉS,
2000, p. 03)
O comportamento agressivo é fruto da estrutura de
nossa sociedade e pode se manifestar tanto na vida familiar quanto na escolar. A educação oferecida pela família desempenha
relevante papel na formação de uma personalidade mais ou menos agressiva,
desenvolvendo diferentes tipos de comportamento. Trata-se de um momento onde as necessidades,
os interesses, as curiosidades e os comportamentos dos jovens entram em choque
com os valores sistematizados da sociedade.
Discussões que envolvem violência, delinquência
juvenil, drogas etc. afligem pais e educadores.
Nesse contexto, Rodrigues afirma que:
Os processos tradicionais de
aprendizagem (condicionamento clássico e operante) explicam grande parte dos
comportamentos agressivos exibidos pelas pessoas. De fato, se uma criança
consegue o que quer através da manifestação do comportamento agressivo, é
provável que este comportamento tenda a repetir-se com mais freqüência (sic)
nessa criança do que em outra cujo comportamento agressivo não surtiu o efeito
desejado. (Rodrigues, 1978,
p. 371)
É importante salientar que, no ambiente escolar, além
dos conceitos e da memorização conferidos pelos educadores, encontra-se um
homem e seu viver. Abordando a
contribuição de Vygotsky para o ensino de Geografia, Cavalcanti (2005, p. 196,
apresenta que “o desenvolvimento
do pensamento conceitual, entendendo que ele permite uma mudança na relação
cognitiva do homem com o mundo, é função da escola e contribui para a
consciência reflexiva do aluno.”
Estas considerações fazem-se presentes na medida em
que a formação de um pensamento reflexivo permite problematizar questões sobre a
organização do espaço, causas sociais, políticas e econômicas que geram desigualdades
entre os homens. Em qualquer situação
que viva, o ser humano tem sempre presente o seu contexto social, sendo este de
fundamental importância para sua integração. A importância destas discussões perpassa belos
bancos escolares, em especial por disciplinas das áreas humanas, como a
Geografia. Cabe ao educador trabalhar
estas questões em sala de aula para estimular uma afável conduta social dos
estudantes, uma vez que a integração social do indivíduo está ligada à sua vida
escolar e esta ao seu convívio familiar.
Uma quebra deste relacionamento pode gerar ações violentas.
Destarte, deve-se evitar que o ambiente escolar
torne-se um lugar de tédio, de desânimo, de desconforto e, muitas vezes, de
autoritarismo, o que pode gerar atos de violência. Faz oportuno apresentar as considerações
tecidas por Santos (2011, p. 60), com relação às aulas de Geografia na escola:
Por parte de muitos alunos, a escola
representa o lugar em que as horas não são medidas pelo tempo do relógio,
porque o tempo não passa, os minutos congelam nas aulas petrificadas de uma
geografia decorativa alheia à realidade e que conta o mundo sob o olhar
fragmentário de partes e gavetas que pouco se comunicam.
Situações como a descrita pela autora são comuns à
quase totalidade das escolas. Tais
condições podem influenciar, direta ou indiretamente, a prática da violência no
meio escolar.
1.4
O BULLYING
Bullying
é uma palavra de origem inglesa adotada em muitos países para definir o desejo
consciente e deliberado de maltratar outra pessoa e colocá-la sob tensão (Fante
e Pedra, 2008). Bully pode ser traduzido como valentão, brigão, tirano. Como verbo, bully, significa tiranizar, amedrontar, brutalizar, oprimir. O substantivo bullying descreve, por conseguinte, o conjunto de atos de violência
física ou psicológica, intencionais e repetidos, praticados por um indivíduo (bully) ou grupo de indivíduos com o
objetivo de intimidar ou agredir outro indivíduo (ou grupo de indivíduos) incapaz
de se defender.
O
bullying é uma forma de violência que
resulta em sérios prejuízos, não apenas ao ambiente escolar, mas à toda a
sociedade pelas atitudes de seus membros. Está diretamente relacionado à formação de
gangues, ao uso de drogas e de armas, à violência doméstica e sexual, aos
crimes contra o patrimônio e, consequentemente, à necessidade de altos
investimentos governamentais para atender a demandas da justiça, dos presídios,
dos programas sociais, da saúde e, é claro, da educação.
Trabalhando
especificamente esta questão, Fante e Pedra (2008), apontam para uma série de
ações que podem ser compreendidas como atos de bullying. Apelidar, ofender,
zoar, sacanear, humilhar, intimidar, encarar, constranger, discriminar,
aterrorizar, amedrontar, tiranizar, excluir, isolar, ignorar, perseguir,
chantagear, ameaçar, difamar, insinuar, agredir, bater, chutar, empurrar,
derrubar, quebrar, furtar ou roubar pertences são considerados atos de bullying. Como pode-se deduzir, tais ações são bastante
comuns no meio escolar.
Alguns
fatores propiciam o bullying, com sua
banalização e legitimização. Atitudes
culturais como o desrespeito, a intolerância, a desconsideração ao “diferente”,
a hierarquização nas relações de poder estabelecidas em detrimento da fraqueza
de outros, o desejo de popularidade e a manutenção do status a qualquer preço traduzem
esta condição. (FANTE E PEDRA, 2008).
Cabe
colocar, outrossim, que certos “professores” também praticam bullying contra seus alunos. Muitos estudantes são perseguidos, intimados,
ridicularizados, coagidos e acuados, inclusive em sala de aula. Ocorrências como estas geram sensação de
impotência e prejudicam o rendimento escolar, promovendo uma desmotivação para
o estudo não só da vítima específica como de outros estudantes. Estas situações podem provocar, também,
reações violentas.
3 MATERIAIS E MÉTODOS
Como fora posto, este trabalho procurou analisar uma
possível relação entre violência e classes sociais em escolas da rede de ensino
do município de São Leopoldo. Além
disto, procurou-se verificar a incidência de alunos vítimas de bullying, bem como a percepção da
comunidade frente à segurança pública no geral.
Para isto, utilizou-se uma metodologia baseada na
coleta de dados em escolas distribuídas aleatoriamente em quatro bairros do
município de São Leopoldo. Foram
escolhidas duas escolas em cada um dos bairros de classes “A” (alta), “B”
(média) e “C” (baixa) selecionados.
Procurou-se selecionar uma escola pública e outra privada por bairro. Entretanto, como no bairro de classe social “C”
não existem escolas privadas, foram escolhidas duas escolas públicas.
O
mapa a seguir (figura 1) apresenta a distribuição das escolas selecionadas no
município de São Leopoldo. O ponto 1 na
figura representa a escola pública 1 localizada no bairro de classe social “C”;
o ponto 2 representa a escola privada localizada no bairro de classe social “A”;
o ponto 3 representa a escola pública localizada no bairro de classe social “A”;
o ponto 4 representa a escola pública 2 localizada no bairro de classe social “C’;
o ponto 5 representa a escola privada localizada no bairro de classe social “B”
e o ponto 6 representa a escola pública localizada no bairro de classe social “B”.
Mapa do município de
São Leopoldo.
|
Escala
0 1200 m
|
Escala
1200 m
|
|
Figura 1 – Localização das escolas
no município
Fonte:
Secretaria Municipal de Planejamento, 2010.
|
Após
a seleção das escolas, foram confeccionadas perguntas que abordavam temas
relacionados à violência, preconceito e segurança pública. Foram tecidas as seguintes indagações:
·
Você
já presenciou alguma forma de violência em sua escola? Que tipo?
·
Você
já sofreu algum tipo de preconceito na sua escola?
·
Você
já sofreu algum tipo de ameaça na escola? Por quem?
·
Você
já viu alguém armado na escola?
·
Você
se sente seguro no caminho para a escola?
·
Você
se sente seguro na sua escola?
·
Como
você considera o policiamento nas proximidades de sua escola?
·
Você
confia na polícia?
Estas questões, com algumas adequações, formaram um
questionário aplicado em turmas do terceiro ano do ensino médio de cada uma das
escolas, em diferentes turnos (diurno/noturno). O número de alunos variou de 22 a 34 por sala.
Conforme solicitação das escolas
participantes da pesquisa, os nomes das instituições não foram divulgados.
Após
a aplicação dos questionários, os dados coletados foram organizados em tabelas
para serem convertidos em gráficos. A
partir daí, os dados foram analisados com base na sua distribuição espacial.
Os
resultados obtidos através da análise dos questionários evidenciaram que os
alunos de todas as escolas, independentemente de classe social ou pelo fato de
ser pública ou privada, já presenciaram alguma forma de violência. A maior incidência ocorreu na escola privada
do bairro de classe social “A”, onde todos os alunos confessaram já terem
testemunhado algum tipo de violência, conforme pode ser verificado pela Figura
2.
Em
relação à forma de violência, de acordo com os resultados mostrados pela Figura
3, tem-se que “briga entre alunos” foi a mais frequente, seguida por “briga de
alunos com pessoas de fora da escola”, ambas ocorrendo em todas as escolas. Outro tipo de violência presente em todas as
escolas foi a “briga entre torcidas organizadas”. Na escola privada de classe “B”, os alunos
citaram apenas duas formas de violência por eles presenciadas: “briga entre
alunos” e “briga de alunos com pessoas de fora da escola”.
Figura 2 – Percentual de escolas que
já presenciaram alguma forma de violência.
Fonte: Autoria
própria, 2010.
|
Figura 3 – Percentual de tipos de violência
citados por alunos.
Fonte:
Autoria própria, 2010.
|
Observou-se,
também, a ausência de “briga entre alunos e professores” em escolas privadas,
ao contrário do que ocorre nas escolas públicas (Figura 3). Formas diversas de violência citadas por
alunos dizem respeito a brigas envolvendo funcionários, pais, assim como um
fato inusitado ocorrido em uma das escolas públicas de classe social “C”: um
roubo, cuja vítima, um aluno, acabou ferido por disparo de arma de fogo em
frente à escola. Este fato foi relatado
por um dos alunos durante a aplicação do questionário na turma.
Posteriormente
foi perguntado aos alunos se os mesmos já haviam sido vítima de algum tipo de
preconceito na escola, tanto por parte de professor ou colega. Todos os alunos, nas diferentes escolas
públicas e privadas em todas as classes sociais, já sofreram algum tipo de
preconceito. A Figura 4 retrata esta
condição.
Figura 4 – Percentual de vítimas de
preconceito.
Fonte: Autoria própria, 2010.
|
É importante destacar que, quando do
questionamento feito aos alunos sobre o sofrimento de ameaças, todos os alunos afirmaram
já terem sido vítimas desse delito, conforme pode ser conferido pela Figura 5. Quanto ao autor da ameaça, percebeu-se que a
prática se dá principalmente por colegas de escola, seguido por pessoas de fora
da escola. A escola pública 1, de classe
social “C”, apresentou um percentual mais significativo deste tipo de
ameaça. É importante salientar, ainda,
que na escola privada de classe social “A”, foi mencionado caso de ameaças
advindo de professores.
Figura 5 – Percentual de ameaças e
seus autores.
Fonte: Autoria própria, 2010.
|
Conforme fora apresentado anteriormente, um dos
questionamentos realizados dizia respeito ao fato dos alunos já terem, ou não, presenciado
alguém armado na escola. Foi considerada
“arma”, todo objeto capaz de ferir outro indivíduo, contemplando armas brancas
(facas e canivetes) e armas de fogo (pistola e revólver). Causou certa surpresa a constatação de que foram
avistadas pessoas armadas em todas as escolas, com maior frequência na escola
privada de classe social “A”, seguido pela escola pública de classe social “B”.
Outros
fatores considerados no questionário diziam respeito à segurança no caminho
percorrido pelos alunos desde sua casa até a escola. Na maioria das escolas, os alunos se sentem
seguros nesse trajeto.
De
igual sorte, os estudantes se sentem seguros dentro das escolas, sejam elas
públicas ou privadas, nos diferentes bairros pesquisados. Sobre essa questão, observou-se que os alunos
se sentem mais seguros em instituições privadas do que nas escolas públicas. Por exemplo, na escola pública 2, de classe
social C, constatou-se o menor índice de segurança (36%) enquanto que a escola
privada, de classe social B, apresentou um índice de 100%, ou seja, todos os
alunos pesquisados se sentem seguros.
Outro
fato analisado através da percepção dos alunos e vinculado aos anteriores,
deu-se em relação ao policiamento nas proximidades da sua escola. Somente as escolas privada, de classe social B
e escola pública 1, de classe social C consideram o policiamento bom. Os alunos das demais escolas o consideraram
ruim.
Já
com relação à confiança dos estudantes na policia, observou-se um grande
descrédito pela polícia nas diferentes escolas e nas diferentes classes sociais. É interessante observar ainda que, como pode
ser visualizado na Figura 6 a seguir, nas classes sociais B e C o índice de
rejeição foi bem maior do que na classe social A.
Figura 6: Percentual de confiança de alunos na polícia.
Fonte: Autoria própria, 2010.
5
CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES
A
análise dos dados coletados evidenciou que as diferentes formas de violência,
assim como a intimidação (bullying)
estão presentes em todas as escolas que participaram da pesquisa. Assim, tanto nas escolas públicas quanto nas
privadas e tanto bairros pobres quanto em bairros mais abastados, a violência
se faz presente.
Talvez,
como decorrência da situação acima, averiguou-se que a segurança pública não
recebe a confiança da comunidade escolar.
Tal constatação torna-se, no mínimo, preocupante.
Através
dos dados obtidos, inferiu-se que não existe classe social mais ou menos
protegida da violência. Em decorrência,
há um anseio pela busca de alguma forma de proteção por parte dos entrevistados.
Seja
como for, de acordo com os resultados obtidos, percebe-se que a violência não
respeita classe social, ou, em outras palavras, pode-se dizer que não é a
pobreza que causa a violência. É claro
que se trata de uma constatação baseada em dados isolados, de uma cidade que
compõe a Região Metropolitana de Porto Alegre.
Todavia, supõe-se que estes dados devam ser repetidos em outras cidades
brasileiras, o que merecerá novas inferências assemelhadas.
Quanto
ao bullying, presente em todas as escolas
avaliadas no estudo, é certo que esta prática que interfere no processo de
aprendizagem e no desenvolvimento cognitivo, sensorial e emocional dos alunos. Este tipo de violência além de favorecer o
surgimento de medo e insegurança nas escolas, tanto para aqueles que são alvos
como para os que assistem calados às mais variadas formas de ataques, pode
interferir na vida futura dos cidadãos. O
baixo nível de aproveitamento, a dificuldade de integração social, o
desenvolvimento ou agravamento das síndromes de aprendizagem, os altos índices
de reprovação e evasão escolar, podem ser consequências do bullying.
Finalmente,
no que diz respeito à desconfiança demonstrada pela comunidade escolar em
relação à força policial, tem-se que esta advém de um pré-julgamento baseado em
fatos históricos onde a polícia era tida como força repressora da sociedade. Muitas opiniões foram formadas a partir de uma
determinada época onde a ação mais enérgica da policia foi utilizada como
solução frente às transformações principalmente políticas de um período
histórico brasileiro. Hoje em dia, quiçá
por notícias veiculadas pela mídia, ao demonstrar mais enfaticamente ações mal
sucedidas dos órgãos de segurança, a antiga desconfiança persiste. Do mesmo modo, a corrupção existente nesses
órgãos, igualmente ressaltada pela mídia, coloca em xeque o verdadeiro papel da
polícia.
Para
se pensar numa sociedade menos violenta, é necessária uma mudança drástica na
forma de se pensar o problema. Certas
atitudes devem ser adotadas para uma efetiva transformação dessa realidade.
Com
relação à questão violência-classe social, os resultados obtidos conduzem à
ideia de desmitificar um preconceito existente, de que a violência se dá onde a
classe social é mais baixa. Os
resultados obtidos apontaram ao fato de que, ao menos para o município de São
Leopoldo, a violência não está relacionada à classe social.
Em
relação ao bullying, tem-se que sua
causa está relacionada especialmente pela omissão das escolas, do governo e da
família. Neste sentido, sugere-se uma maior
intervenção das direções das escolas nos atos ocorridos no âmbito escolar, uma
vez que estas parecem esquivar-se desta função. Também se faz necessário a disponibilização de
espaços pra debater o tema. Os governos,
por sua parte, deveriam dispor de políticas educacionais de orientação frente à
problemática, capacitando o corpo docente para prepará-lo a intervir nessas
questões, inclusive na formatação dos conteúdos a serem ministrados. Os pais, por sua vez, devem manter-se próximos
a realidade escolar de seus filhos, evitando, assim, que sofram com esse tipo
de exclusão.
No
que diz respeito à polícia, propõe-se que a mesma adote procedimentos adequados,
a fim de que a sociedade sinta o comprometimento com o seu trabalho, resultando
em confiança e respeito. Certos
programas, como o PROERD, exercido pela Brigada Militar em escolas da rede
publica estadual, tem obtido sucesso no combate ao consumo de drogas em
escolas.
Ações
como as apontadas certamente não resolveriam o problema da violência nas
escolas. No entanto, a dedicação e o
comprometimento de cada órgão responsável, além da sociedade em geral, por
certo amenizariam os altos índices de violência e reduziriam os atuais índices
vivenciados pelo município de São Leopoldo.
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
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[1] Prefeitura Municipal de São Leopoldo.
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